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As razões por trás do apoio do PT a Lira na Presidência da Câmara

Lula e o PT resolveram que o melhor é tentar construir uma boa relação com o presidente da Câmara.

Da Rede M1 - por BBC Brasil
30/11/2022 15h55 Atualizado em 30/11/2022 16h13

Pragmáticos, Lula e Lira têm dialogado após a eleição - Foto: Reprodução/CorreioBraziliense

Pesou na decisão o trauma petista com a péssima relação do governo Dilma Rousseff com o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, crise que culminou no impeachment da presidente em 2016.


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Agora, diante da certeza de que Lira deve se reeleger independentemente da vontade do futuro governo, Lula e o PT resolveram que o melhor é tentar construir uma boa relação com o presidente da Câmara desde já.

Na terça-feira (29/11), PT, PV e PC do B (siglas que formam uma federação partidária), junto com PSB, partido do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, oficializaram seu apoio a um novo mandato de dois anos para Lira no comando da Casa. Com isso, o alagoano se consolida para ser reeleito numa ampla aliança, que inclui desde os partidos da futura base de Lula, como as siglas que apoiam o atual presidente Jair Bolsonaro (PL).

Lira foi aliado fiel do atual governo, engavetando dezenas de pedidos de impeachment contra Bolsonaro. Seu perfil, porém, é bastante pragmático. Assim que a eleição de Lula foi anunciada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o presidente da Câmara parabenizou o presidente eleito e disse que "a vontade da maioria jamais deverá ser contestada", num claro distanciamento do discurso bolsonarista de questionar a segurança do sistema de votação brasileiro.

Segundo o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), seu partido decidiu apoiar a reeleição de Lira porque sua vitória "já está praticamente garantida". Dessa forma, disse à BBC News Brasil, o PT procura construir uma boa relação com o comando da Câmara que facilite a futura aprovação de projetos de interesse do governo Lula.

"Nós precisamos governar agora. Não adianta a gente lançar um candidato contra um que já ganhou por uma marcação de posição", reforçou.


Além da boa relação com Lira, Lula tenta garantir a governabilidade atraindo partidos de centro-direita para a base do governo, já que as siglas mais à esquerda não garantem maioria de votos no Congresso. O presidente eleito está em negociação com União Brasil, MDB e PSD.

Aliado de Bolsonaro, Arthur Lira foi eleito presidente da Câmara pela primeira vez em 2021 - Foto: Reprodução/Redes Sociais

PEC e disputa por cargos na Câmara

O analista político Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), também considera que seria muito "temerário" o PT tentar enfrentar Lira na disputa pelo comando da Casa. Na sua visão, pesa ainda no cálculo político a necessidade de uma boa relação com Lira para conseguir aprovar ainda neste ano uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que autorize um aumento dos gastos do governo no próximo ano, a chamada PEC da Transição.

Nessa proposta, o presidente eleito tenta liberar até R$ 198 bilhões de despesas acima do Teto de Gastos em 2023, mas depende que o texto seja aprovado com agilidade na Câmara e no Senado. O próximo governo quer usar esses recursos para ampliar o valor do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família, além de destinar mais recursos para investimentos em obras e programas sociais, como o Farmácia Popular e o Minha Casa Minha Vida.

Outro ponto importante no apoio do PT a Lira, nota Queiroz, é a tentativa de garantir que postos-chave da Câmara sejam ocupados por aliados do governo ou, pelo menos, que não fiquem nas mãos de bolsonaristas, como o comando da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ), órgão que analisa se as propostas em tramitação na Casa estão de acordo com os princípios constitucionais.

Como o PL elegeu 99 deputados, futura maior bancada da Casa, o partido tem preferência na escolha dos cargos. A bancada eleita, ressalta Queiroz, é uma mistura de deputados muito fiéis a Bolsonaro, que entraram mais recentemente no partido, e antigos congressistas da sigla, de perfil mais pragmático.

No entanto, caso o PT, que elegeu a segunda futura maior bancada (68 deputados), forme um bloco maior com outros partidos dentro da Câmara, poderá passar à frente do PL na distribuição dos cargos.

"Eu acho que tem muita chance de, através de um partido aliado, ao formar um bloco, (o PT) indicar o presidente da CCJ. Mas, de antemão, ao apoiar o Lira, vai ter a garantia de que (Lira) não vai entregar a CCJ a ninguém ligado a Bolsonaro. Pode até ser do PL, eventualmente, mas não pode ser dessa turma fundamentalista (mais fiel a Bolsonaro)", acredita.


O futuro do "Orçamento Secreto"

A federação liderada pelo PT e o PSB juntos somam 94 deputados. Além deles, outros dez partidos já formalizaram apoio a reeleição de Lira, o que garante maioria para reelegê-lo: União Brasil (59 deputados), PP (47), Republicanos (41), PDT (17), Podemos (12), PSC (6), Patriota (4), Solidariedade (4), Pros (3) e PTB (1). E também são esperados os apoios de PL (99) e PSD (42).

Na avaliação de Queiroz, Lira viabilizou sua reeleição ao gerenciar na Câmara a distribuição do chamado Orçamento Secreto — dezenas de bilhões em emendas parlamentares que desde 2019 foram destinadas por deputados e senadores a suas bases eleitorais em operações pouco transparentes que têm dado margem a possíveis desvios.

Esse mecanismo, oficialmente chamado de emendas de relator, em referência ao parlamentar relator da lei orçamentária, transferiu para o Congresso um grande volume de recursos antes geridos pelos ministérios.

A proposta de Orçamento para 2023 encaminhada pelo governo Bolsonaro ao Congresso prevê R$ 19 bilhões para essa despesa no próximo ano.

Durante a campanha, Lula chamou o Orçamento Secreto de excrescência e criticou o excesso de poder nas mãos de Lira.

"O Bolsonaro é refém do Congresso Nacional. O Bolsonaro sequer cuida do orçamento. O orçamento quem cuida é o (Arthur) Lira, ele que libera verba, o ministro liga para ele, não liga para o presidente da República. Isso nunca aconteceu desde a proclamação da República", disse o petista em entrevista ao Jornal Nacional em agosto.


Apesar disso, as emendas de relator não devem acabar no próximo governo. Mas, segundo Zarattini, a gestão Lula deseja dar "transparência total" a esses gastos. Além disso, disse o deputado, o governo quer definir quais serão as áreas prioritárias para uso dessas verbas.

"O governo é que deve dirigir para que tipo de uso vai o dinheiro. Lógico que o deputado vai influenciar também, dirigindo os recursos para os locais das suas bases, mas a partir de um plano onde o governo estabelece as suas prioridades", defendeu Zarattini.


Queiroz, do Diap, ressalta que as emendas do relator não são uma despesa impositiva, ou seja, sua liberação pelo governo não é obrigatória. Por isso, ele avalia que Lula terá condição de fazer essas mudanças (dar transparência e definir áreas prioritárias).

Para tornar essas despesas impositivas, Lira teria que conseguir alterar a Constituição, o que exige o apoio de ao menos três quintos dos deputados e senadores.

Na avaliação de Queiroz, isso não é viável no momento porque o tema é impopular na sociedade e o PT deve ter uma base suficientemente ampla para evitar uma alteração do tipo no texto constitucional.


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